Leia a crônica “A insônia dos justos”, de Moacyr Scliar, para responder às questões 17 e 18 . Desde aquela história de Jó contada no Antigo...
Leia a crônica “A insônia dos justos”, de Moacyr Scliar, para responder às questões 17 e 18.
Desde aquela história de Jó contada no Antigo Testamento, Deus e o Diabo não apostavam sobre os seres humanos, com o que a eternidade já estava ficando meio monótona. O Maligno resolveu, então, provocar o Senhor: que tal uma nova aposta? Deus, na sua infinita paciência, topou.
Dessa vez, contudo, o Diabo estava decidido a não perder. Para começar, escolheu cuidadosamente o lugar onde procuraria sua vítima: um país chamado Brasil no qual, segundo seus assessores ministeriais, a diferença entre pobres e ricos chegava ao nível da obscenidade. Os mesmos assessores tinham sugerido que se concentrasse em aposentados, pessoas que sabidamente ganham pouco.
O Diabo pôs-se em ação. Foi-lhe fácil induzir um erro no sistema de pagamento de aposentadorias, com o qual um aposentado recebeu, de uma só vez, mais de R$ 6 milhões. E aí tanto o céu como o inferno pararam: anjos, santos e demônios, todos queriam ver o que o homem faria com o dinheiro. O Diabo, naturalmente, esperava que ele se entregasse a uma vida de deboches: festas espantosas, passeios em iates luxuosos, rios de champanhe fluindo diariamente.
Não foi nada disto que aconteceu. Ao constatar a existência do depósito milionário, o aposentado simplesmente devolveu o dinheiro. Eu não conseguiria dormir, disse, à guisa de explicação.
O Diabo ficou indignado com o que lhe parecia uma extrema burrice. Mas então teve a ideia de verificar o quanto o homem recebia de aposentadoria por mês: menos de R$ 600. Deu-se conta então de seu erro: a desproporção entre a quantia e os R$ 6 milhões da tentação tinha sido grande demais.
Mas o Diabo aprendeu a lição. Pretende desafiar de novo o Senhor. Desta vez, porém, escolherá um milionário, alguém familiarizado com o excesso de grana. Ou então um pobre. Mas neste acaso fornecerá, além de muito dinheiro, um frasco de pílulas para dormir. A insônia dos justos tira o sono de qualquer diabo.
(O imaginário cotidiano, 2002.)
SANTA CASA 2023:
a) Em sua crônica, Moacyr Scliar configura, a seu modo, uma moral da história. Transcreva a moral da história dessa crônica. Justifique sua resposta.
b) Cite uma expressão hiperbólica empregada pelo cronista no último período do terceiro parágrafo. Justifique sua resposta.
GABARITO:
a) A moral da história encontra-se no último período: “A insônia dos justos tira o sono de qualquer diabo”. Ela sintetiza o fato de o diabo não se conformar com as pessoas que têm ética e não conseguem transgredir, pois elas ficariam com sentimento de culpa, não conseguiriam dormir, caso obtivessem o dinheiro de maneira equivocada e desonesta. Essa moral rígida, incorruptível, irrita o diabo, tira-lhe o sono.
b) Na expressão “rios de champanhe” há hipérbole, pois o novo rico, segundo o desejo do diabo, beberia diariamente tanto vinho champanhe que isso poderia ser comparado ao fluir de um rio.
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